"Porque "seus olhos estão sempre me perguntando algo", você diz. E você começa sua loucura que me faz gostar ainda mais de você. Empurra a palma contra o peito e diz "eu gosto assim, Tati, fechado, protegido, eu gosto". Então você olha para o meu copo d'água e diz: "eu sou só um copo d'água, mas você ficava me olhando e pensando nas bolhas e nos gelos e nos canudinhos e na transparência e se a água era isso ou aquilo. Água é só água, por que você complica a água, Tati?". Então apagaram a luz e eu quis me esconder dentro do seu paletozinho de publicitário descolado e ouvir suas batidas descompassadas e embaladas pelo seu cheiro de alma boa. Mas você pegou na minha mão e continuou dizendo que uma mão, muitas vezes, é apenas uma mão. Mas que eu insistia em enxergar os buracos entre os dedos, os anéis que separavam os dedos, a dor da separação dos dedos, a gota da bebida gelada entre os dedos. E que você não poderia suportar isso. A maneira como eu te olhava. Vendo mais, inventando mais, complicando mais. E eu quis te dizer que tudo bem, eu seria uma menina simples. Eu mataria meu narrador, minhas possibilidades, meus mundos, minhas invenções. Só de ver seus cachos mais grisalhos e rococós ornando seus medos e superficialidades eu desejei não ser mais eu pra ser qualquer coisa que pudesse ser sua. Mas enchi meu peito surrado e murcho de coragem e te disse que, infelizmente, onde você era apenas um copo d' água eu era a tempestade."
* pedacinho do texto "Um copo de água" da Tati Bernardi.
Pra quem sempre vê as coisas além do que elas são,mas sabe que a vida é melhor por causa disso.
Um comentário :
Valeu.
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