“ Não sou uma pessoa boa. Raramente me preocupo com os outros, e a África pouco me importa. Nem a fome. Nem as baleias. Nem você.”
Isso é o que o odiado colunista da Folha de São Paulo, Luiz Felipe Pondé, afirmou em um dos seus textos. Assim que eu li isso, pensei “que babaca”. Mas depois eu pensei mais um pouco, li o texto todo e mudei minha opinião. Ele não é babaca. Ele só é como a maioria das pessoas. Mas diferente delas, ele teve a coragem de perceber isso e de admitir para quem quiser saber. E é justamente essa hipocrisia que ele critica em seus textos. Afinal, ninguém vai admitir uma coisa dessas nem pra si próprio. Assim que lemos isso pensamos que ele é uma pessoa totalmente sem coração, sem paramos pra pensar se nós nos importamos com tudo isso. A gente pensa “nossa, eu me importo”. Mas será? Será que a gente se importa mesmo? Ou será que a gente só sabe que existe, vê que existe, fica triste por uns segundos, mas depois esquece? Acredito que tenham pessoas que se importam. Pessoas com um coração enorme, eu diria. Que vivem suas vidas se dedicando a trabalhos voluntários. Mas mesmo assim essas pessoas escolhem algo para se dedicarem. Ou à fome, ou às crianças, ou às florestas ou qualquer coisa. Elas escolheram por algum motivo, que provavelmente é o que elas mais se importam. Também existem aqueles mais raros que se importam com um pouquinho de tudo.
Mas a questão é que nós, a maioria, (e eu estou me incluindo nessa), não nos importamos com nada disso. Nós não pegamos boa parte do nosso salário e nos dedicamos a ajudar alguém. Não gastamos parte do nosso dia, ou sei lá, do nosso fim de semana para contribuir para que alguém sinta menos fome, ou frio. Ok, nós doamos roupas no natal e no inverno, damos 50 reais todo mês a uma creche e ao wwf e vamos visitar crianças em orfanatos uma vez por ano. Mas será que isso é se importar realmente? Não estou aqui pra julgar ninguém, afinal, quem sou eu pra julgar algo que eu também faço. Mas quando nós nos importamos mesmo, ao pé da letra, com algum parente ou amigo a gente se dedica muito até deixar a pessoa bem, ou pelo menos fazer o que está ao nosso alcance. A gente não fica “poxa, ele ta triste né? Poxa ele ta doente, e agora? Acho que o médico resolve”. Não. A gente fica lá com a pessoa, liga, conversa. Realmente se importa que ela fique bem. É justamente isso que eu to falando. Não sei se é errado a gente não se importar. Você trabalhou o mês inteiro, quer guardar seu dinheiro pra viajar e talvez 100 reais faça muita falta pra você. Talvez você não tenha mesmo como ajudar financeiramente. Você passou a semana toda trabalhando e quando chega sábado, você quer dormir mais, ir à praia, pro clube, descansar e curtir com os amigos. E aí? Não sobra tempo pra ajudar quem você diz que se importa. Porque se se importasse de verdade não deixaria de ajudar nunca.
Minha mãe, por exemplo, doa uma quantia de dinheiro todo mês para uma creche, mas foi lá uma vez para ver quem ela estaria ajudando e nunca mais foi. Ela não vai lá todo mês pra ver se o dinheiro dela está sendo realmente aplicado, se está realmente dando algum retorno para aquelas crianças. E o mundo continua assim mesmo. Todo mundo achando que é muito bom, mas na verdade ninguém é totalmente bom. Você faz isso pra dizer que fez ou só pra limpar a consciência? Nós nos mascaramos para nós mesmos. Querendo tapar o sol com a peneira. “Não, eu sou voluntário sim. Eu ajudo sim. Eu fui numa creche ano passado”. Já fiz isso comigo um milhão de vezes. Mas eu não me importo realmente. Eu sou uma egoísta. Por que é feio falar que não se importa. O bonito é falar que fez. Mas na verdade não fez mais. E é por isso que todo mundo é assim. Porque ninguém quer ser julgado, porque sabe que julga também. É por isso que todos falam muito e fazem pouco. Falar é fácil. Todo mundo sabe disso. Todo mundo mente pra si mesmo, então fica mais fácil mentir para os outros.
E é muito feio. Muito feio o que a gente faz. Não de não se importar, mas não se importar e querer julgar o outro que a gente está nem aí. Querer julgar sem saber nada do outro é pior do que só não se importar. Mas todo mundo faz isso e ninguém tem vergonha de julgar na cara dura.
Mas enfim, não estou falando que a gente tem que se importar com todas as pessoas do mundo. Só estou falando que a maioria das pessoas é hipócrita em relação a isso. E aí a gente joga a culpa em outras pessoas, no governo, no diabo a quatro. Mas nós nunca somos os culpados verdadeiros. E a culpa é sim de todo nós, por criamos um mundo onde tudo fica por baixo dos panos, onde a hipocrisia reina e nada se resolve porque ninguém admite a culpa e ninguém se aceita de verdade.
Que a grande maioria das pessoas não vai realmente se importar com as outras, isso é fato. Mas há quem esteja disponível para ajudar o planeta de alguma forma. Nem que seja gastando 20 minutos do seu dia fazendo alguma coisa para o próximo. Isso não significa que você esteja realmente se importando sempre, mas quer dizer que você estará ajudando e se importou pelo menos naquele instante. Já que ninguém se importa, seria interessante pelo menos ajudar. Existem várias formas de ajudar sem ser apenas daqueles modos tradicionais que todo mundo já sabe. E é preciso também se importar de verdade e não fingir que se importa para falar que fez. Encontre algo que realmente te inspire e que faça você querer ajudar sempre. Minha meta a partir de agora é encontrar algo que eu me importo. Tudo que é feito de coração, mesmo que seja o mínimo possível já faz um efeito gigantesco, e se tratando de solidariedade é dessa mesma forma. Não ajude por ajudar. Ajude por que você quer, e procure algo que você queria ajudar. Se não for alguém, que seja a natureza,que seja os animais, que seja dentro da sua própria casa. Eu recebi uma proposta incrível essa semana. É um projeto voluntário para apresentar uma peça infantil em hospitais com crianças que têm câncer, e em creches com crianças carentes. E foi incrível saber que eu vou ajudar da forma que eu mais amo, que é fazendo teatro. Vou fazer sorrir por uma hora milhares de criancinhas que sofrem em grande parte do tempo. E isso pra mim é gratificante porque estará vindo lá de dentro e eu não estou querendo provar pra mim nem pra ninguém que eu sou uma pessoa boa. Eu não sou. Só achei uma forma de ajudar que tem tudo a ver comigo e eu vou amar me importar e fazer tudo para que todas aquelas crianças se esqueçam por um instante toda a tristeza que se passa.
Se cada um encontrar sua própria maneira de ajudar, num jogo limpo, sem querer impressionar a si mesmo, sem querer cumprir o papel de bonzinho que a sociedade exige, talvez o mundo se transforme num lugar melhor. Mais transparente, mais fluido, mais honesto.
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